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11.8.10

PARAR UMA DISCUSSÃO

Discutir com as pessoas que mais amamos não é necessariamente mau. Compreendo que para algumas pessoas os traumas do passado possam ser responsáveis pela evitação do conflito mas, de um modo geral, as relações íntimas dependem das discussões para amadurecer. Como não existem almas gémeas, crescer numa relação implica aprender a conviver com alguém que é diferente de nós, sem dramas. Divergir pode até levar-nos a discussões intensas, mas não necessariamente a discussões perigosas. Quando os ciclos viciosos se instalam, as pessoas deixam de discutir sobre o que é realmente importante, passando a fazê-lo por tudo e por nada. Quando a escalada atinge este nível, as pessoas sentem-se perdidas, descontroladas, sem perceber muito bem em que ponto começam as discussões.

À medida que as discussões de tornam frequentes, é cada vez mais difícil manter a calma e o discernimento, pelo que, assim que um dos lados acende o fogo, o outro começa a regá-lo com combustível. Quando as discussões tomam conta da vida de um casal, a paciência esgota-se e cada provocação é seguida de uma postura defensiva e/ou de um contra-ataque. O desrespeito agudiza-se e, mesmo que se trate de assuntos banais, o desgaste é inevitável.

Antes do enraizamento destes ciclos viciosos – que provavelmente merecerão intervenção especializada – é possível agarrarmo-nos à serenidade que nos resta para tentar travar a escalada de agressividade. Para isso é preciso que interiorizemos que nem tudo o que é dito (pelo outro) deve ser levado à letra.

O que pode alguém fazer se o seu cônjuge fizer um pedido estapafúrdio, colocar uma pergunta ofensiva ou fizer um comentário insultuoso? À partida, a generalidade de nós ferverá em pouca água e responderá impulsivamente alimentando, sem querer, uma discussão inútil. O mais inteligente, nestes casos, seria manter a calma, perguntar ao outro “O que é que disseste?”, forçando-o a repetir o disparate e “sair de cena”. A mensagem que queremos passar é “Eu não vou alimentar esta estupidez” ou “Não vou permitir que me arrastes para esse nível”.

Num exemplo clássico, um dos membros do casal acusa o outro de estar a ser infiel. E se há situações que podem facilmente desencadear uma crise de confiança, esta não deixa de ser uma acusação que, feita em falso, feriria qualquer um. Reagir com agressividade não só não resolveria nada como provavelmente agudizaria a fúria do cônjuge. Se, em vez disso, usarmos o humor e a linguagem não verbal para trazer o outro para o campo do discernimento, a probabilidade de sucesso é maior. Tocar gentilmente no ombro da pessoa de quem se gosta é uma ferramenta poderosa, como o é “brincar” com a situação dizendo algo como “Como é que eu poderia ter um affair se isso implicaria ter duas pessoas a apontar-me o dedo em vez de uma?”. O objectivo é dizer ao outro que “a acusação não tem qualquer fundamento”. Claro que o humor não deve ser confundido com sarcasmo ou com qualquer tentativa de humilhação.

Às vezes o que é preciso é respirar fundo e tentar empatizar com os sentimentos do cônjuge, ter compaixão pelo seu sofrimento. Nessa altura, a resposta à acusação/ insulto pode passar sobretudo por perguntar “O que é que está REALMENTE a incomodar-te?” ou “Qual é o motivo de tanta raiva? O que é que aconteceu?”. Não é fácil adoptar o papel de cuidador quando estamos perante um ataque, mas este carinho é essencial para passar da aflição à união. Quando colocamos estas questões com genuíno interesse, as perguntas acabam por desarmar o outro e abrem espaço para o aparecimento da verdade. O cônjuge até pode começar a chorar, permitindo-nos aceder ao que está por detrás da raiva e mostrando-nos que basta que nos mantenhamos disponíveis para que tudo mude num instante.

Quando o que está em causa são os limites do respeito e da dignidade de cada um, pode ser crucial fechar a porta à discussão. Dizer algo como “Se não consegues manter o respeito por ti e por mim, não vale a pena continuarmos a conversar” não é uma fuga ao problema, mas uma imposição de respeito, responsabilizando o outro pelas suas escolhas.

Quando somos capazes de manter a calma, em vez de reagirmos impulsivamente, mostramos a nossa preocupação em relação à saúde e ao bem-estar da pessoa que amamos. Mostramos que que as acusações e a hostilidade não levam a lado nenhum. Voltando à metáfora do fogo, se nos apercebemos de que o fogo está descontrolado, compete-nos afastar tudo o que possa funcionar como combustível para que este possa ir embora.

Em vez de reagirmos a cada ataque, a cada acusação, como se disso dependesse a salvação da nossa honra, importa que paremos e coloquemos algumas questões:
  • Estarei a adoptar uma postura reactiva ou responsável?
  • Prefiro ter razão ou estar feliz?
  • Isto é assim tão grave?
  • Durante quanto tempo quererei alimentar esta discussão?

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