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3.10.11

VIOLÊNCIA EMOCIONAL

Apesar de já ter escrito sobre a violência psicológica nas relações amorosas volto hoje ao tema porque, infelizmente, se mantém actual, tal como se mantém actual a necessidade de desfazer alguns mitos. São (demasiado) frequentes os casos de mulheres (sim, sobretudo mulheres) que chegam até ao meu consultório – em terapia conjugal ou individual – com queixas que se enquadram em cenários de violência psicológica e que se mostram surpreendidas quando as confronto com este rótulo. Nalguns casos as queixas de reacções impulsivas e intempestivas surgem intercaladas com comentários mais ou menos elogiosos ao comportamento do companheiro. Talvez por isso – porque existem períodos de maior acalmia, estas mulheres são capazes de descrever o parceiro como alguém “extremamente afável, bom marido”, ainda que “às vezes” este perca o controlo e as agrida verbalmente. A violência pode passar por reagir com impaciência e agressividade às necessidades da mulher, atirar objectos para o chão ou contra a parede quando se sentem enfurecidos ou desgastados com qualquer assunto (que até pode ser exterior à relação), fazer comentários depreciativos/ humilhantes como “não vales nada”.

Não sei o que me surpreende mais nestes casos – se a existência de comportamentos violentos que se prolongam ao longo do tempo e com os quais a mulher, de uma forma ou de outra, condescende, se o facto de estas mulheres considerarem que “se tirarmos estes episódios, ele é um marido perfeito”. Não existem maridos nem mulheres perfeitas e as pessoas casadas ou que vivam um compromisso sério devem ser tolerantes em relação aos defeitos da pessoa amada mas isso não inclui a permissividade/ passividade em relação a qualquer forma de violência. Não há nada de saudável numa relação que é pontuada por episódios de agressividade e tentativas de humilhação do cônjuge. De resto, estes episódios deterioram de tal forma a auto-estima do cônjuge agredido que, a páginas tantas, é praticamente impossível discernir sobre o que é e o que não é aceitável.

Há relativamente pouco tempo uma mulher queixava-se em terapia do facto de o marido, apesar de ser um profissional respeitado e sociável, capaz de criar laços em diversos contextos, ser muito crítico em relação às amigas dela. Sem dar por isso, a senhora permitiu que estas críticas condicionassem de forma séria o seu comportamento, na medida em que, de forma gradual, deixou de convidar estas pessoas para ir lá a casa, as saídas começaram a ser cada vez mais raras e até a partilha dos problemas deixou de ser feita com aquelas em quem antes confiava. Sem perceber, cedera à pressão do marido, tentando que ele não ficasse “indisposto” com uma visita, condescendendo em relação a exigências como “não fales da tua vida privada com essas pessoas”. Pouco a pouco, esta mulher ficou limitada em termos sociais e a situação agravou-se depois de o marido sugerir que ela deixasse de trabalhar para ficar em casa com as crianças. A mulher sociável e independente de outrora deu lugar a alguém cuja insegurança chegou ao ponto de depender de uma pequena mesada do marido para comprar alguma coisa para si. A sua vida passou a ser controlada por outrem.

De um modo geral, estes agressores são descritos como profissionais, amigos, vizinhos “impecáveis”. O seu comportamento em público é irrepreensível e, também por isso, torna-se difícil fazer queixas e receber crédito. Até em termos familiares estas mulheres ouvem muitas vezes coisas como “talvez estejas a exagerar, ele farta-se de trabalhar e é tão bom marido…”, o que alimenta o ciclo vicioso.

Nenhuma relação afectiva deve incluir qualquer forma de violência, pelo que os gestos intempestivos, o exercício de controlo e os comentários que traduzam humilhação devem ser imediatamente travados. O agressor deve estar ciente de que estes são comportamentos que traduzem falta de respeito pelo outro e que não podem ser tolerados. As marcas que resultam da condescendência em relação à violência emocional são potencialmente lesivas do amor-próprio do cônjuge agressivo, bem como dos filhos do casal.
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